O Lago
Deslizam suavemente na superfície líquida e transparente do pequeno ribeiro. Mergulham ambos, ritmadamente. Agitam a cauda, abrindo um leque de água e purpurinas, ensaiando uma dança ancestral.
Afundam o bico em cada pena, por baixo das asas, num ritual
tão sagrado quanto banal. Lado a lado. Ele, de cores vibrantes entre o verde-esmeralda
e o azul-safira, exibindo no pescoço um colar branco. Ela, igualmente elegante,
salpicada de tons acastanhados.
Embora não seja possível calar o ruído da via rápida aqui ao
lado, abstraio-me e, por momentos, dou por mim no lugar mágico da minha
infância. Tinha 6 ou 7 anos. Durante as férias, acordava cedo, levava uma
sandes e um banquinho para junto do lago e sentava-me a observar, maravilhada.
À volta do lago cresciam lilases que, na primavera, perfumavam o ar. Fecho os
olhos e sinto ainda o aroma delicado e inconfundível. Os arbustos eram altos e
cresciam em direção ao centro do lago, numa abóboda que filtrava os raios de
luz, tornando-o sombrio e mágico.
Em baixo, os patos permaneciam imóveis, invertidos,
inebriados entre os feixes de luz e o alimento que buscavam no fundo do lago. E
eu ali a observar, silenciosamente. Tudo à volta se dissolvia. Apenas eu, os
patos e o lago.

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